domingo, 15 de novembro de 2015

Primeira noite em Santiago do Chile






Com o atraso na travessia pela cordilheira dos Andes e pela complexa revista na aduana chilena, acabamos chegando à Santiago por volta das 20h00. Eu estava assustada e insegura, mas precisava ser forte e passar confiança ao meu marido, que com certeza estava se sentindo mais perdido do que eu.
Descemos na rodoviária central da cidade, que estava lotada e logo tratamos de pensar qual seria o modo mais simples (e barato) de chegarmos ao apartamento que tínhamos alugado.

Não me recordo como, nem de onde surgiu,  mas alguém me indicou um senhor idoso que faria quase o mesmo trajeto que a gente e fomos pedir ajuda à ele. Ele estava com sua esposa esperando uma conhecida, que chegaria por alí,  e prontamente nos disse que o meio mais barato de nos locomovermos por Santiago era utilizando o metrô. Segundo ele, os taxistas se aproveitariam de nós, inexperientes turistas e poderiam cobrar um valor acima da média do valor pelo trajeto . Ele iria de metrô também e poderia nos acompanhar.

Fomos todos andando pelas lotadas ruas de Santiago até chegarmos à estação mais próxima. Tínhamos uma imensa dificuldade de comunicação, mas lembro que diversas vezes ele falou o quanto a cidade era perigosa por seus furtos às carteiras dos desavisados. Muitas vezes ele falou também que nós éramos doidos de termos feito tudo pela internet e termos vindo de um outro país sem nem saber falar a língua local.
Ele fez o trajeto de metrô com a gente e por piedade talvéz, acabou decidindo que nos levaria o mais próximo possível de nosso apartamento, muito depois de sua estação. Descemos e caminhamos um bom pedaço.

Descobri que aquele homem era um revolucionário que lutou contra a ditadura em seu país e que havia sido preso por defender seus ideais. Ele nos mostrou alguns lugares importantes e com um grande valor histórico, por onde íamos passando e nos deu muitas dicas preciosas sobre passeios e segurança, e não aceitou nada de nós pelo imenso favor de nos acompanhar. Mesmo assim, insistimos e demos uma nota de pouco valor dinheiro brasileiro para ele guardar de lembrança e ele ficou muito grato.
Infelizmente tenho uma memória muito fraca para nomes. Mas o rosto dele e de sua gentil esposa, nunca vou esquecer.

Minha primeira noite efetivamente no Chile foi marcada por essa incrível demonstração de gentileza e empatia com o próximo, como se mostraram ser todas as outras enquanto estive neste país incrível.
Uma demonstração de que, apesar da maldade do mundo, ainda é possível confiar e ser confiável e que essa entrega ao desconhecido, pode resultar em coisas muito boas  e experiências enriquecedoras.

Chegamos da forma mais barata, sãos e salvos ao nosso apartamento. Desfizemos as malas e como notamos um movimento absurdo no centro, ainda àquela hora da noite, decidimos andar e ver o que tinha à nossa volta.
Mais especificamente: 
FOMOS PROCURAR ALGO PARA COMER.
 Na minha cidade, no centro, assim que o comércio fecha_o que ocorre ralativamente cedo, logo no início da noite_ tudo vira um grande deserto e em consequencia disso, uma caminhada noturna é algo impensável.
Foi muito legal ver uma cidade, tarde da noite, em pleno vapor. Tudo aberto e funcionando.



Achamos um mini Market e compramos algumas coisas que poderíamos usar para cozinhar e compramos a pizza mais deliciosa que já comemos em nossa vida, no Papa Johns. Logicamente apanhando e rindo muito por causa de nosso espanhol fraco.

A cidade era vibrante, cheia de energia, cheia de gente interessante. Achei muito legal e me senti muito segura.  Chegamos em casa já bem tarde da noite.

Comemos e tratamos de ir pra cama. O outro dia começaria cedo: visita guiada pelo Palácio La Moenda, desbravar o centro da capital chilena, visitando museus e pontos turísticos.







De São Paulo à Santiago, Atacama, Arequipa e Cusco, tudo de ônibus - Resumo/ Pensamentos da Autora



OPINIÃO:

A viagem foi incrível. Um pouco cansativa sem dúvidas, porém maravilhosa. Tudo ocorreu de modo tranquilo, me senti muito segura e as paisagens eram simplesmente deslumbrantes.





SE RECOMENDO?

Com certeza. Acho que foi uma maneira incrível de se chegar à Santiago, e também de percorrer a América do Sul. Claro que se eu tivesse usado a razão, nunca teria feito desse jeito. Foi uma verdadeira loucura. Eu sei. Meus familiares e amigos tentaram de tudo para nos convencer de não fazer desse jeito, diziam que podíamos ser assaltados, sequestrados, enrolados, etc... E com certeza realmente corremos um risco enorme dessas coisas acontecerem: dois estrangeiros, que desconheciam completamente a língua e cultura locais, duas pessoas que, apesar de tudo, insistiram em confiar, acreditando que ainda existem pessoas boas neste mundo. E eu sei que existem, porque encontrei muitas delas nessa aventura.

No fim, usamos o coração e foi uma grata surpresa. Tudo teve um sabor especial, cada quilômetro rodado teve um sabor de aventura e desafio. Foram inúmeros aprendizados, inúmeras pessoas legais que encontramos no nosso caminho, e que sem elas, talvez não tivéssemos chegado ao nosso destino final. 
Tive um vislumbre de um pedacinho minúsculo da América do Sul, através da janela do meu assento, durante as paradas que fazíamos, nas cidades que visitávamos. 
Entendi muitas coisas que antes eram muito distantes da minha realidade.

Com certeza foi a melhor forma que eu e o Claudio descobrimos para ter uma noção do que seria aquela viagem. Desde o começo, a intenção era que esta fosse uma viagem de aventura, sem luxos, e ainda assim, visitando lugares que a maioria das pessoas PENSA que são inacessíveis, só pra gente rica e/ou acostumada ao espírito aventureiro, o que eu provei para mim mesma que não é verdade.
A maneira mais barata, foi a maneira mais legal para esta pessoa que está escrevendo: uma mulher com recursos financeiros limitados, gordinha e nada atlética, que mal fala o português (imagina o espanhol),  e sem experiência internacional alguma.








Passamos dias incríveis e memoráveis em Santiago.
Saímos de Santiago e rumamos para o deserto do Atacama. O lugar dos meus sonhos.

Vimos  a paisagem mudar aos poucos através de nossas janelas. Das folhagens alaranjadas das árvores à secura total do deserto.

Do Atacama, sempre em ônibus, chegamos em Arica e atravessamos mais uma fronteira, agora Chile/Peru, agora em um táxi coletivo até a cidade peruana de Tacna, com pessoas completamente estranhas. Estávamos amedrontados, mas chegamos sãos e salvos à Tacna.

Um ônibus imundo, fedendo à xixi, saindo de Tacna nos levou à Arequipa e finalmente me apaixonei pelo Peru.

Depois, triste por deixar Arequipa tão cedo, um luxuoso ônibus nos levou à Cusco. 
Cusco. Cidade incrível, colorida, charmosa e cheia de história.

Dias depois, fizemos a trilha da Hidrelétrica, no coração da selva peruana até Machu Picchu. E voltamos para Cusco.

De Cusco, Puerto Maldonado, Iñapari. 
Transporte tipo Tuk tuk, depois mais 4 horas em van coletiva e precária, chegamos à Assis Brasil, cruzando finalmente a fronteira com o Brasil.

Lá, pegamos um táxi com um peruano e sua filha, dividimos a corrida.
Entramos rapidamente na Bolívia e circulamos um pouco, voltamos para nossa rota até chegarmos na capital do Acre: Rio Branco, quase seis horas depois.

Só lá, pegamos um avião para voltarmos à São Paulo. Estávamos muito cansados para pensar em ônibus.

E só tenho coisas legais para falar e recordar, mesmo nos momentos em que sentimos medo, quando tivemos dificuldade de comunicação, com a falta de banho e conforto. Ainda assim, com certeza, faria tudo de novo se tivesse a oportunidade.

Claro que teria sido maravilhoso também se eu tivesse feito de uma maneira mais confortável e elegante, mas PARA MIM, não teria sido tão especial, porque só a ida já foi uma aventura em si.
Já nos primeiros momentos dessa viagem eu me desafiei e superei meus medos e limites. Me senti forte e preparada, capaz de enfrentar as muitas coisas que estavam por vir, não só na viagem, mas na vida.
Só isso já valeu demais para mim. Só por isso já valeu a pena eu ter levantado da cama e ter saído da minha zona de conforto.









Acho que nunca vou esquecer a sensação de atravessar a Cordilheira dos Andes. Medo e emoção. Tudo ao extremo.
Se eu fechar os olhos, ainda posso sentir as águas geladas do oceano Pacífico sob meus pés.
E a sensação estranha de andar sobre a neve.
Nos meus olhos, ainda estão as cores das cidades, por onde passamos, ainda estão gravadas as imagens do Aconcágua, do vulcão Licancabur, do deserto sem fim...
Nos meus ouvidos, as músicas peruanas surgem sempre, assim como imagens incas variadas.








Nos perdemos muitas vezes durante essa viagem... mas nos encontramos, em todos os sentidos dessa palavra, nessa extraordinária terra chamada América do Sul e também em nós mesmos.


De São Paulo à Santiago com a Chile Bus - parte IV



A travessia pela Cordilheira dos Andes foi longa. Intermináveis horas na estrada.
O lado argentino da Cordilheira estava completamente sem neve, em uma época em que a neve já deveria estar cobrindo toda a paisagem.
Confesso que fiquei realmente preocupada, mas toda aquela beleza natural não me deixava desanimar e o tempo inteiro eu agradecia por estar ali.

Mas, como mágica, a neve surgiu.
De repente, paisagem ficou completamente branca e eu me pus à chorar novamente, emocionada, pois a neve é uma novidade para uma pessoa que vive em um país tropical. (inclusive hoje, dia em que estou escrevendo esse post, fez agradáveis 37° de temperatura na minha cidade ... hahahhahah)

A vontade era de gritar para o motorista: "_Motorista, pare esse ônibus que eu quero descer!!!"
Mas... me contive e apenas fiquei olhando encantada aquela imensidão branca pela janela.

O hino chileno começou a tocar pouco antes da chegada à aduana e foi lindo ver o grau de patriotismo dos chilenos que estavam voltando felizes à sua pátria. Foi uma grande festa, com palmas, assovios, etc...


Também próximos à aduana Argentina/Chile, tratamos logo de jogar as comidas fora, pois foram logo avisando que a aduana chilena era rigorosa quanto à entrada de alimentos, plantas e coisas do tipo no país e que até se cobrava uma multa altíssima, caso fosse encontrado em nossa bagagem coisas do gênero.

O ônibus finalmente parou e pudemos descer.
A primeira coisa que fiz foi, timidamente, ir direto para a neve acumulada na beira do asfalto.

O branco total irritou meus olhos. Eles ardiam muito.

O ar era diferente, pesado, e foi difícil respirar. Fiquei muito cansada apenas por dar poucos passos até a beira da estrada e senti um pouco de tontura. Parecia que por mais que eu respirasse, meus pulmões não enchiam.
Entendi que aqueles eram os primeiros sintomas da altitude e me apavorei. Enquanto isso, meu marido não sentiu nenhum mal estar.







Eu sendo besta, brincando com a neve.



Encontrei um policial  e fui até ele, com muito medo de falar alguma coisa errada no meu espanhol bosta. Perguntei à quantos metros de altitude estávamos e ele, muito sorridente e simpático me disse que à 3000  m de altitude.

Um parágrafo só pra dizer: EU AMO O POVO CHILENO. Extremamente educados, simpáticos, sorridentes e sempre dispostos à ajudar.

Continuando...

Nossa... 3000 m de altitude e eu já estava morrendo.
Eu só pensava: "_ Meu Deus, se aqui eu estou assim, como vou me sentir no Atacama, ou em Cusco? Como vou conseguir fazer a trilha que me levaria até Machu Picchu, no Peru?"

Fizemos uma enorme fila, organizada pelo número do assento.
Eu e o Claudio fomos os primeiros. Entregamos papéis, pegamos papéis, mostramos os passaportes, que foram carimbados. Fila na aduana argentina para sair, depois fila na aduana chilena para entrar naquele país.

Fomos revistados em uma sala. Todos enfileirados, lado à lado, com um cão cheirando nossos pertences. Foi um pouco assustador tudo aquilo, mas deu tudo certo com a gente.
Um casal de brasileiros que levavam uma grande quantidade de roupas de ginástica_ provavelmente para revender_ foi questionado e intimado à mostrar toda a mercadoria. As peças foram contadas uma à uma e isso atrasou tudo.

Eu, que ainda encantada com a novidade da neve, voltei para a área externa o mais rápido que pude.

Experimentei as famosas empanadas chilenas, fiz câmbio das notas argentinas (que por sinal, nem usamos), tirei mais um milhão de fotos.

Um tempo depois, já estávamos aos pés do techo de estrada mais temida por mim durante a viagem:
LOS CARACOLES...

Foi aterrorizante ver de cara a altura que estávamos  e que começaríamos a descer, em uma estrada cheia de curvas completamente fechadas, e para completar, sem guardrail.
Meu coração parecia que ia sair pela boca, tamanho era o meu medo.
Mas fui me acalmando à medida que chegávamos mais perto do fim desse trecho de estrada, que apesar de tudo era bem sinalizada e os carros, caminhões e afins, que por ela passavam respeitavam e muito o limite de velociadade, não passando dos 40km/h.


Mas...
Como nem tudo são flores, a revista do tal casal atrasou e muito nossa chegada à capital chilena e a previsão voltou à ser  de uma chegada noturna.